A coerência da fé e a incoerência da maçonaria

É sempre salutar recordarmos que a Igreja Católica de forma alguma compactua com a maçonaria ou tem algum tipo de relação com ela. São duas extremidades diferentíssimas. Fiquemos atentos às advertências daquela que é nossa Mãe e Mestra, sobretudo mediante a epidemia de missas que tem sido celebradas em prol da maçonaria.

E lembrando o que escrevera o Sumo Pontífice Clemente XII na Sua Bula In Eminenti Apostolatus Specula, já postada aqui no blog:

“Deste modo, Nós ordenamos precisamente, em virtude da santa obediência, que todos os fiéis de qualquer estado, grau, condição, ordem, dignidade ou preeminência, seja esta clerical ou laica, secular ou regular, mesmo aqueles que têm direito a menção específica e individual, sob qualquer pretexto ou por qualquer motivo, devam ousar ou presumir o ingresso, propagar ou apoiar estas sociedades dos citados Liberi Muratori ou Franco-maçons, ou de qualquer outra forma como sejam chamados, recebê-los em suas casas ou habitações ou escondê-los, associar-se a eles, juntar-se a eles, estar presente com eles ou dar-lhes permissão para se reunirem em outros locais, para auxiliá-los de qualquer forma, dar-lhes, de forma alguma, aconselhamento, apoio ou incentivo, quer abertamente ou em segredo, direta ou indiretamente, sobre os seus próprios ou através de terceiros; nem a exortar outros ou dizer a outros, incitar ou persuadir a serem inscritos em tais sociedades ou a serem contados entre o seu número, ou apresentar ou a ajudá-los de qualquer forma; devem todos (os fiéis) permanecerem totalmente à parte de tais Sociedades, Companhias, Assembléias, Reuniões, Congregações ou Convenções, sob pena de excomunhão para todas as pessoas acima mencionadas, apoiadas por qualquer manifestação, ou qualquer declaração necessária, e a partir da qual ninguém poderá obter o benefício da absolvição, mesmo na hora da morte, salvo através de Nós mesmos ou o Pontífice Romano da época”.

Acreditar no que se quer ou no que se deve?

Ninguém pode voltar-se para Deus e para o mundanismo ao mesmo tempo.

O ardoroso empenho para o renovamento da Fé na Igreja e nos corações é como chama crepitante que procura iluminar as nações, mesmo aquelas mais distantes, e aproxima-se dos corações, mesmo os mais gélidos. Luz e trevas parecem pairar sobre o nosso mundo hodierno. De um lado uma realidade sombria, que nos cerca pelos crimes atrozes vaticinados contra a vida do homem e sua dignidade; de outro lado temos a luz, daqueles que, conscientes da sua missão, testemunham de forma clarividente o exercício da fé cristã, conformando-se ao que dissera Cristo aos apóstolos: “Vós sois o sal da terra… vós sois a luz do mundo” (Mt 5, 13.14).

Sois sal; sois luz! Pois quisera, Senhor, que todas as pessoas – ao menos aquelas que se comprometeram convosco – fossem sal; quisera que aquelas que dizem Vos ouvir e enchem vosso templo fossem luz. Mas assim não é!

Fosse o mundo mais fiel, que digno de fé; mais amante, que amado; mais humilde, que soberbo. E muitos corações, ainda assim, preferem as glórias do mundo, que são vãs e passageiras, que as glórias eternas e alegres de Deus. A sociedade, com seu rápido avanço tecnológico, está mais centrada em saciar seus bolsos de dinheiro do que saciar seus corações áridos de palavra e amor. Mundo injusto, cruel, cego… Até quando vereis apenas o que quereis, mas não o que deveis? Serás salvo pelo que queres ver ou pelo que ignoras? Dizem os muitos teólogos que o oitavo sacramento é o da ignorância. Como? Sim, e assim quisera Deus que o fosse para cumprir o seu projeto salvífico de salvar o maior número que almas. Esta ignorância, entretanto, distingue-se daquela outra que não edifica, mas destrói. Há, pois, dois tipos de ignorância: A dos que não conhecem porque não querem e a dos que não conhecem porque não podem.

Quanto a primeira está dito no livro da Sabedoria: “Postea non suffecit errasse eos circa Dei scientiam, sed et in magno viventes inscientiae bello, tot et tam magna mala pacem appellant – Como se não bastasse terem errado acerca do conhecimento de Deus, embora passando a vida numa longa luta de ignorância, eles dão o nome de paz a um estado tão infeliz” (14,22). Infeliz do homem que conhece e insiste em viver uma falsa paz, forjada num lapso de felicidade e numa lacuna existencial. O Cristianismo não deve coadunar com essa pacificidade contraditória que subsista na infelicidade do homem, em sua autodestruição, na perfídia do mal que avantaja sobre os pressupostos existências daquela Paz verdadeira, que Cristo porta à humanidade. E aqui cabe à Igreja exortar para que não se enveredem em caminhos tortuosos senão naquela via verdadeira de salvação que consiste no Evangelho.

O grande problema dessa crise existencial dá-se sobretudo por aquilo que foi chamado pelo então Cardeal Ratzinger como “ditadura do relativismo”, o que pretendo tratar num próximo artigo, atendo-me aqui àquilo que foi proposto em nosso tema. Em quem devemos acreditar ou no que acreditar? Naquilo que consiste em uma realidade visível e agradável aos nossos olhos ou naquela em que somos movidos pela fé, pelo ímpeto que nos leva a conhecermos as razões pelas quais cremos? Para isso devemos nos deter agora na segunda ignorância.

Esta consiste naquela que adverte o livro de Eclesiásticos e que é o “oitavo sacramento”, como comumente costuma-se dizer: “Qui prius fui blasphemus et persecutor et contumeliosus; sed misericordiam consecutus sum, quia ignorans feci in incredulitate – a mim que outrora era blasfemo, perseguidor e injuriador. Mas alcancei misericórdia, porque ainda não tinha recebido a fé e o fazia por ignorância” (I Tm 1,13).

A advertência do Apóstolo São Paulo vale também para os tantos a quem o Evangelho permanece ainda anônimo. Sabemos que a estes, não por culpa própria, mas por infortúnio, o evangelho é ainda um enigma a ser desvendado, e, portanto, não o amam e não o testemunham. Esses são aqueles para os quais a Igreja não desvia os olhos misericordiosos, sendo-lhes imputadas as palavras da Lumen Gentium:

“Com efeito, aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo, e a Sua Igreja, procuram, contudo, a Deus com coração sincero, e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir a Sua vontade, manifestada pelo ditame da consciência, também eles podem alcançar a salvação eterna. Nem a divina Providência nega os auxílios necessários à salvação àqueles que, sem culpa, não chegaram ainda ao conhecimento explícito de Deus e se esforçam, não sem o auxílio da graça, por levar uma vida recta. Tudo o que de bom e verdadeiro neles há, é considerado pela Igreja como preparação para receberem o Evangelho, dado por Aquele que ilumina todos os homens, para que possuam finalmente a vida. Mas, muitas vezes, os homens, enganados pelo demónio, desorientam-se em seus pensamentos e trocam a verdade de Deus pela mentira, servindo a criatura de preferência ao Criador (cfr. Rom. 1,21 e 25), ou então, vivendo e morrendo sem Deus neste mundo, se expõem à desesperação final” (n. 16).

Aos seus filhos a Igreja dirige o solícito apelo para que não se cansem de propagar, com a própria vida, o Reino vindouro que prefigura-se na Igreja e concretiza-se no advento definitivo do Senhor, fazendo com que milhares possam gradativamente aderirem ao Reino de amor e paz, edificado sobre a justiça e a verdade.