É hora de despertarmos! O Senhor vem ao nosso encontro!

Com o 1º Domingo do Advento, damos início ao novo tempo litúrgico que acontece nos ciclos trienais da Igreja.

Precisamente no Advento vemos “nascer” em nós a expectativa da vinda do Senhor. O Messias que vem para libertar-nos do mal e nos redimir com o Seu sangue redentor. É um tempo de deixar que floresça uma nova vida, unida a Deus e submissa aos seus mandamentos. E isto São Paulo nos apresenta na segunda leitura, particularmente, em uma passagem que consideramos riquíssima e profunda, pondo-nos em contato com Deus, que nos chama a sermos filhos da luz. Escreve ele:

“Vós sabeis em que tempo estamos, pois já é hora de despertar. Com efeito, agora a salvação está mais perto de nós do que quando abraçamos a fé. A noite já vai adiantada, o dia vem chegando; despojemo-nos das ações das trevas e vistamos as armas da luz. Procedamos honestamente, como em pleno dia; nada de glutonerias e bebedeiras, nem de orgias sexuais e imoralidades, nem de brigas e rivalidades. Pelo contrário, revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13, 11-14a).

Paulo utiliza de palavras escatológicas para alertar aquela comunidade e também a nós, sobre a demasiada situação de ociosidade. É hora de despertarmos! O Senhor vem ao nosso encontro, mas a nossa vida só terá verdadeiro sentido quando também nós formos ao encontro d’Ele. Este ir não deve ser apenas uma experiência de Cristo, senão também uma experiência nossa. Obviamente que Paulo se referia também a uma possível vinda iminente do Senhor Jesus para encerrar a História; no entanto, estas palavras que ecoam ainda hoje nesta sociedade que alguns vivem contra os valores do Evangelho, convidam-nos a um imediato despertar diário, e não apenas no momento próximo ao advento definitivo de Cristo Jesus.

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Nossa Senhora da Expectação

Mais adiante, o apóstolo nos afirma que a salvação está mais próxima que antes, nos primórdios, ao abraçarmos a fé. Não nos é difícil compreender tais palavras, pois, ao abraçarmos a fé ela ainda está como que imatura; mas, com o decorrer da caminhada ela se torna firme, consistente. Mas, para isso, é preciso que ela seja colocada no coração do Pai, e que n’Ele encontre o seu princípio e fim. Comparemo-la a uma planta que, para tornar-se verdejante e bela, precisa ser bem cuidada e receber toda a dedicação.

Aqui chegamos a uma das passagens de Paulo que mais me toca e fazem-me associá-las de imediato com a hodierna sociedade, com as quais ela incide e se configura. Despojar-nos das ações das trevas! Afastemo-nos da impureza! Abramo-nos a Cristo! Para que, entrando em nossas vidas, possamos achar plena realização, que dar-se-á unicamente n’Ele. Nos afastemos de tudo o que é mal! Nos afastemos do pecado, da ganância, da luxúria, da preguiça, da falta de amor, das drogas. Deixemos que Cristo seja a nossa armadura. Revistamo-nos d’Ele! Ele nos faz vencer qualquer perigo! Não é preciso que usemos de objetos violentos, mas que levemos conosco e em nós, aquele que pode nos dar a eterna felicidade; que é doce e, ao mesmo tempo, rigoroso, não obstante a isso, mesmo em sua rigorosidade, Ele é infinitamente misericordioso.

Assim, pois, escreve Santo Agostinho:

“Quem não tem inquietações, aguarda com serenidade a vinda do Senhor. Pois que amor a Cristo é esse que teme sua chegada? Irmãos, não nos envergonhemos? Amamos e temos medo de sua vinda. Odiemos, portanto, estes mesmos pecados e amemos aquele que virá castigar os pecados. Ele virá, quer queiramos, quer não. Se ainda não veio, não quer dizer que não virá. Virá em hora que não sabes; se te encontrar preparado, não haverá importância não saberes” (Santo Agostinho Apud Alimento Sólido, pág. 61).

A que horas vem o Senhor? A qualquer hora! Ele virá e nós seremos surpreendidos pela sua gloriosa vinda. E isto relata-nos Jesus no Evangelho de São Mateus: “A vinda do Filho do Homem será como no tempo de Noé. Pois nos dias, antes do dilúvio, todos comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. E eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e arrastou a todos. Assim acontecerá também na vinda do Filho do Homem” (vv. 24, 37-39).

Na hora menos esperada vem o Senhor. E eis que devemos prepararmo-nos. Qual é o prazer que o pecado pode oferecer se sabemos que, por seu jugo poderemos padecer por toda a eternidade? Podemos nos perguntar se não é melhor sofrermos agora do que sofrer durante toda a eternidade?

Ora, como a imprudência dos homens fez com que Deus devastasse o mundo com o torrencial dilúvio, assim serão também as almas imprudentes e que fecham-se ao Evangelho, destinadas ao eterno tormento. É melhor padecermos aqui, abraçando a Cristo e tendo todas as consolações que d’Ele provêm.

Na quinta-feira passada estava andando pela rua, e em minha pequenina cidade todos sabem da minha vocação à vida sacerdotal. De repente, ouvi alguém gritar: “Os Padres são pedófilos!” E correu! Ora, sabia que aquelas palavras se dirigiam para mim. Mas o que fiz? O que poderia fazer senão rezar? Eu sei que os padres, em sua grande maioria não são pedófilos, mas sei também que Satanás se utiliza de diversas artimanhas para nos desviar do caminho de Cristo. Pois saiba Ele que, quanto mais nos provar mais serei fiel e mais rezarei. Tenho consciência que devo padecer aqui, para só em Cristo ser feliz eternamente.

Que Maria Santíssima nos ajude a esperarmos vigilantes e na oração o Seu Filhg Bendito. E que este novo Ano Litúrgico possa renovar-nos e colocar-nos em comunhão profunda com Jesus.

Infelicidade: O castigo do pecado

“Interroga os tempos antigos que te precederam, desde o dia em que Deus criou o ser humano sobre a terra. Investiga, de um extremo a outro dos céus, se houve jamais um acontecimento tão grande, ou se jamais se ouviu algo semelhante! Existe porventura algum povo que tenha ouvido a voz de Deus falando-lhe do meio do fogo, como tu ouviste, e tenha permanecido vivo? Ou terá vindo algum Deus escolher para si uma nação entre todas, por meio de provações, sinais e prodígios, por meio de combates, com mão forte e braço estendido, por meio de grandes terrores, como tudo quanto fez por vós o SENHOR, vosso Deus, no Egito — diante dos teus olhos? Reconhece, pois, hoje, e grava em teu coração que o SENHOR é o Deus lá em cima no céu e cá embaixo na terra, e que não há outro além dele. Guarda suas leis e seus mandamentos que hoje te prescrevo, para que sejas feliz, tu e teus filhos depois de ti, e vivas longos anos sobre a terra que o SENHOR teu Deus te dará para sempre”. 

Deuteronômio 4,32-34.39-40

Esta é a primeira leitura da Solenidade da Santíssima Trindade, ano B. Enquanto ia acompanhando a leitura, esta frase particularmente me tocou: Guarda suas leis e seus mandamentos que hoje te prescrevo, para que sejas feliz.

Sempre que lia o Pentateuco eu encarava as ameaças contra os transgressores da Lei Divina como um castigo ativo. Deus garantiria que os pecadores fossem malditos. Ou seja, por uma ação divina os violadores da lei seriam punidos.

Porém a vida deu voltas. O filho pródigo sai da casa do Pai. O Pai não intervém. E o filho é a causa de sua própria infelicidade. Comecei a coigtar comigo que a transgressão da Lei Divina, o fundamento moral da lei natural, feito para as criaturas de livre-arbítrio e manchadas pela concupiscência da carne, é para sua felicidade, para a sua completude, para que atinjam a felicidade que Deus as havia reservado quando as criou. Criaste-nos para vós, Senhor, e nossa alma não repousa enquanto não descansar em vós disse Santo Agostinho, lapidarmente sintetizando o tão procurado Sentido da Vida.

Estou plenamente convicto, agora mais experiente, que não é Deus a causa da infelicidade que vém do pecado, mas é uma conseqüência natural, tal como uma bola cair ladeira abaixo quando solta. Qual é o estado de suprema infelicidade? O Inferno. O Inferno é o ponto de distância infinita de Deus, é o limite da criatura quando o pecado tende ao infinito. E é o ponto de maior infelicidade de universo.

Quando na desolação um demônio ou minha concupiscência vem me sugerir transgressão, não mais preciso apelar para as penas do Inferno, nem para a Lei Divina. Sou um homem vivido e curtido, tive minhas fases de filho pródigo, também comi lavagem de porcos na miséria de minhas escolhas ruins. Eu apelo para a memória e minha experiência mesmo. É minha razão que vai buscar toda a dor que já sofri no arquivo da memória e diz Você quer isso de volta? É a razão que pesa na balança os prazeres transitórios propostos e as penas que eles acarretaram em meu passado. E não são penas depreendidas pela Fé, nem a imaginação tentando visualizar o inimaginável Inferno, não. Não é a infelicidade após a morte, é a infelicidade também em vida!!! É a própria experiência, sofrida, comprovada, marcada a ferro em brasa na carne, são as cicatrizes de batalha, os traumas e a punição temporal dos pecados. Punição temporal, sim, aqui nesta terra o pecado também já cobra seu preço de dor e lágrimas. Aqui morro de fome!!! (Lc 15,17) Agora é a Razão que combate a concupiscência, já que não aprendeu pelo bem, pela Fé, aprendeu pelo mal, como filho miserával e faminto. Foi bom para mim ser afligido, a fim de aprender vossos decretos (Sl 118,71). Como diria o ditado: gato escaldado tem medo de água fria. O leitor que já passou por isso me entende, tenho certeza.

Felizes os que nunca precisaram se atirar na lama para saber que ela suja!!! Felizes os que obedientes a lei de Deus nunca se desviaram!!! Felizes os que repelem as tentações pela Fé apenas, não pela memória do que já viveram!!! Estes são os verdadeiros sábios!

O Deuteronômio é claro que a Lei de Deus deve ser seguida para que sejas feliz. Não é Deus quem castiga quem se desvia dele. É o desvio que faz já o castigo. Sendo que Deus é a felicidade, Criaste-nos para vós, Senhor, e nossa alma não repousa enquanto não descansar em vós, qualquer desvio é certeza de dar no vazio e rolar abaixo a longa ladeira do abismo da infelicidade…

Originalmente publicado no Jornadas Espirituais

Meditações das cartas paulinas – 1º Tes, cap. 2

No capítulo 2 da sua carta à Tessalônica (nos versículos 1 a 12), Paulo faz uma re-memória de como surgiu aquela comunidade e das dificuldades que logo no início, e ainda agora, estavam enfrentando.

Escreve ele que antes de fazer chegar o anúncio a ela, em Filipos, foram maltratados e sofreram ultrajes (cf. v. 2). Pois eis uma realidade que nunca deixou de fazer-se presente na história da Igreja: a perseguição, as injúrias. Quantas vezes a Igreja de Deus foi – e é – perseguida por um mundo que não deseja se adaptar ao Evangelho, mas quer que o Evangelho se adapte a ele? Quantas vezes cristãos morreram dando sua vida pela Igreja e pelo anúncio do Evangelho da Salvação?

Mas, o que consola a Igreja? O que a faz tornar-se mais firme a cada perseguição? O que faz com que ela não pereça mediante as investidas do inferno? São Paulo responderá para nós estas interrogações: “O nosso Deus nos deu coragem e segurança para vos anunciar seu evangelho, em meio a muitas lutas” (v. 2). Sim! Estamos firmes em Deus, e somente quando estamos firmes n’Ele, teremos coragem para anunciar a Boa Notícia, mesmo que venham inúmeras perseguições.

Estas, porém, não são maiores do que a certeza da presença de Deus conosco. Ele está conosco e nos guia! Não temamos! Se o mundo nos odeia por causa da nossa missão, não cabe a nós mudá-lo, mas devemos nos mudar, sobretudo, pelo nosso testemunho de discípulos do Senhor. E este não deve ser ilusão. Aliás, o cristão não pode fundamentar-se em ilusões; não pode ceder a ideologias que tendem a fazer com que este mundo nos traga plenamente a felicidade. Aqui seremos perseguidos para então, no céu, sermos agraciados em contemplar a face de Deus. Agraciados em contemplarmos o Amor, mas este contemplar não se restringe apenas a uma visualização, vai além: nos insere em Deus e faz com que possamos beber da Sua fonte inesgotável.

E é assim que falamos, não para agradar a seres humanos, mas a Deus, que examina em nossos corações. Aliás, sabeis muito bem que nunca bajulamos ninguém, nem fomos movidos por alguma ambição disfarçada – Deus é testemunha. Também não buscamos glória humana, nem junto de vós nem junto dos outros, embora, como apóstolos de Cristo, pudéssemos fazer valer nossa autoridade” (v. 5-7).

Mais uma vez vemos figurar um retrato da Igreja, um protótipo de como ela deve ser. É chamada a ser modelo dos apóstolos nos dias atuais. Mas, cabe também aqui meditar cada palavra desta bela afirmação do apóstolo.Se o Evangelho não incomoda, então há algo errado. As reações por parte de algumas pessoas, em protestos, de certa forma, dão a plena certeza de que a Igreja vai na direção certa; Ela cumpre sua missão em denunciar todas as obras do mal (cf. Ef 5,11) e em abrir as portas da sociedade para Deus, para que Ele possa renová-la.

Ambição disfarçada”. Com estas palavras, São Paulo exorta também aos nossos pastores, para que jamais se deixem levar pela ambição, e que jamais sua vida doada em prol do Evangelho seja revestida de um caráter ganancioso. O verdadeiro pastor serve, é humilde, e despretensioso. Não se configura com potências econômicas, mas modela a sua vida tendo Cristo como protótipo, não obstante as veementes perseguições pelo [e do] mundo.

O Pastor deve, antes de tudo, servir e, servindo, será elevado em sua obra. Agindo in persona Chrsti, o sacerdote é elevado pelo próprio Cristo, é resplandecido, é revestido das majestosas vestes do Rei, que na cruz reinou sobre o mal e o pecado, mostrando que, para ser Rei não é preciso ser detentor do poder material, mas antes e, sobretudo, do poder espiritual.

E aqui entra uma questão radical: “Estávamos dispostos, não só a comunicar-vos o evangelho de Deus, mas a dar-vos nossa própria vida” (v. 8). Tão grande era o carinho de Paulo com aquela comunidade que ele faria uma doação maior do que o anúncio que fazia: ele encarnaria as próprias palavras das Escrituras nele mesmo.

E hoje? Será que somos capazes de assumir o Evangelho em sua totalidade? Será que seríamos capazes de sofrer as conseqüências que suscitariam por nosso amor incondicional a Cristo? Quem busca felicidade já nesta vida encontrará dor na outra. Renunciar mesmo a vida parece ser uma decisão quase impossível, mas os mártires nos mostram que, para quem está com Deus, perder a vida é ganhar a alma, e isto mais vale.O cristão deve deixar exalar o perfume da santidade; deve deixar-se cingir pelo óleo da pureza e da perseverança; deixar emitir o “odor de Cristo”.

No versículo 9, Paulo se refere aos “trabalhos e fadigas”. Certamente, por ser ele um artesão, um confeccionador de tendas, ofício este que desempenhou desde a infância, tendo aprendido com seu pai, deveria atuar nesta área. Sabia da sua condição de apóstolo, e poderia viver à custa do anúncio do Evangelho, mas, na maioria das vezes, costumava não fazê-lo. Ademais, o fato de em Tessalônica fixar o trabalho, mostra que passou ali determinando tempo, dedicando-se a organizar aquela comunidade.

 

“Nós encorajamos e adjuramos todos e a cada um de vós a que leves uma vida digna de Deus, que vos chama para o seu Reino e glória.” (v. 12).

Também a nós são dirigidas estas palavras. Deus nos convida, a cada instante, para participarmos do Seu Reino. Parusia não é apenas um acontecimento que conclui a história da humanidade; pelo contrário: ela abre as portas para uma nova vida. Uma vida em Deus, que nos faz mergulhar em seu coração, fonte de todo o Amor.

 

Somos sempre chamados ao Reino de Jesus

Chegando ao final de mais um ano litúrgico, a Igreja nos convida a celebrarmos a Solenidade de Jesus Cristo Rei do Universo, instituída pelo Papa Pio XI, em 1925. E seria muito interessante, mesmo já tendo feito em outras oportunidades, que meditássemos sobre o Reino de Deus e o seu advento escatológico.

Uma pergunta que justamente é feita em nossos dias é: Jesus é Rei? Como pode ser Ele rei, se vivemos em um mundo secularizado, anticlerical, que vive como se Deus já não mais existisse, que põe-se contra os valores do Evangelho e os ensinamentos da Igreja? “Cristo Rei, sois dos séculos Príncipe, Soberano e Senhor das nações! Ó Juiz, só a vós é devido julgar mentes, julgar corações”. Assim canta a Igreja neste dia, reconhecendo que, ainda que sejam impetuosas as forças contra o Evangelho, maior é o senhorio de Jesus, que jamais abandona a sua Igreja e os seus filhos.

Tenhamos em mente, por primeiro, que o Reino do qual nosso Senhor fala manifesta-se de forma diferente dos reinos deste mundo. Não é um reino de precipitação e nem deixa-se corromper. Mas, manifesta-se, sobretudo, com características cristãs: “Reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz” (Prefácio da Missa de Cristo Rei).

Celebrar a Solenidade de Cristo Rei é celebrar também a realeza da Igreja. Não seria, porém, audaz fazê-lo? Verdadeiramente não! Porque ela é Esposa de Cristo, e é participante perene da sua realeza e dos seus mistérios salvíficos. Por isso, na segunda leitura, no hino cristológico que introduz a carta aos Colossenses, São Paulo afirma: “Ele é a Cabeça do Corpo, isto é, da Igreja” (Cl 1, 18). Cabeça e corpo, eis uma outra definição comumente presente nas cartas paulinas. Jesus é cabeça da Igreja, nada seria feito sem seu consentimento. Ele guia a Igreja como seguidora dos seus mandamentos, e nos torna servos por meio de sua realeza. Porém, esta realeza não é uma imposição, muito menos uma obrigação. Ela parte de uma consciência de estarmos contritos a Deus, unidos a Ele, sabendo que com Ele as dificuldades podem ser suprimidas mais facilmente, e que teremos sempre uma luz a guiar nossos passos.

Jesus Cristo não é um rei de ira. Não é alguém que nos força a segui-lo; mas, amando a todos igualmente, nos faz um convite ao qual nos cabe decidir: segui-Lo para as eternas alegrias, ou precipitarmo-nos no abismo do pecado. O inferno, no entanto, não é para que se imponha medo a quem não segue Cristo, mas é uma conseqüência das nossas ações já neste mundo. Como relata Jesus a Santa Faustina: “Antes de vir como justo Juiz, venho como Rei de Misericórdia” (Diário, 83).

Eis um Rei ao qual todos podem recorrer! Um Rei que é misericórdia, que ama e que perdoa. Um Rei que sabe que os valores espirituais superam os meros bens materiais, ao qual muitas vezes nos apegamos exacerbadamente. Ora, o próprio Cristo dá-nos o exemplo de humildade. O que Ele abraçou? As riquezas? Os poderes reais passageiros? O ouro? O luxo? Em que consiste seu Reino? Em uma suposta satisfação material? Em aparências? Não! O que Cristo abraçou muitos não teriam coragem de fazê-lo. O que Jesus abraçou, com todo o olhar misericordioso e com todo o seu amor, é a cruz. Unicamente a cruz!

Na cruz atinge-se o ápice da manifestação messiânica e real de Jesus. Ali Ele não apenas se mostra como Rei, como também redime o mundo por seu sacrifício, que também e sobretudo é um sacrifício real de Amor. Agora, pois, se perguntarmos: para que tanto apego às riquezas? Para que tanta ganância que consome as pobres almas que agora riem, mas irão padecer nos tormentos? Voltemo-nos para a única riqueza: Jesus Cristo. Submetamo-nos à sua realeza singular e salvífica!

O Evangelho nos apresenta a cena da crucifixão do Senhor. Prometendo o Paraíso ao ladrão arrependido, Jesus mostra que, mesmo diante da imensidão dos nossos pecados, maior é sua misericórdia, e as portas do seu Reino estão abertas para acolher a todos: “Hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23, 43). Por isso, observa Santo Ambrósio:

“Ele pedia ao Senhor para que se recordasse dele, quando estivesse no seu Reino, mas o Senhor respondeu-lhe: Em verdade, em verdade te digo, hoje estarás comigo no Paraíso. A vida é estar com Cristo, porque onde está Cristo ali está o Reino” (Exposição do Evangelho segundo Lucas, 10, 121).

Poderíamos convictamente afirmar que o Reino, no quadro evangélico, foi antecipado ao ladrão, pois não estará com Cristo no fim dos tempos, quando vier o tão esperado Reino; mas já o está hoje, neste momento! Mesmo diante das zombarias para que descesse da cruz, Cristo não cede a essas tentações de manifestação de poder. Parece-nos paradoxal, mas justamente permanecendo na cruz Ele manifesta sua glória. Também a nós é dito: não fujamos da cruz. Não nos deixemos seduzir pelas tentações do prazer e de uma vitória superficial. E, desta forma, poderemos dizer a Deus, como o povo disse a Davi: “Aqui estamos. Somos teus ossos e tua carne” (2Sm 5,1). Conduza-nos e não nos deixes sucumbir perante as tentações de relativização da verdade e de uma conquista meramente material. Faze-nos que sejamos servos de uma realeza eterna e salvadora, a nós confiada pelo Batismo.

Que Maria, nossa mãe, Rainha do Céu e da terra, nos guie ao encontro de Seu Filho, o Rei dos séculos!

 

Meditações sobre as Cartas Paulinas – 1ª Tessalonicenses, Cap. 1

Estamos iniciando o estudo do corpo da Carta Paulina aos Tessalonicenses. Hoje gostaria de falar do capítulo 1º.

Como podemos ver logo no começo, dirige-se à comunidade de Colossos, não somente Paulo, como também Silvano e Timóteo, como eles mesmos definiram: “À igreja dos tessalonicenses reunida em Deus Pai e no Senhor Jesus Cristo” (v. 1). Conforta-nos, de certa forma, saber que Paulo não dirigia-se a indivíduos isolados, mas a uma comunidade de fé, reunida em Deus, por meio de Jesus Cristo. Garante suas orações pela comunidade e deseja-lhes graça e paz, de todo o coração sabemos que ele no-lo faz. Nutria, verdadeiramente, um sentimento de alegria pela comunidade.

Lembramo-nos da ação de vossa fé, do esforço de vosso amor e da constância de vossa esperança em nosso Senhor Jesus Cristo” (v. 3).

O cristão ama! Esta verdade percorre dois mil anos com tamanha vivacidade. Não é um amor puramente sentimental, que restringe-se aos limites humanos. É um amor que plenamente se realiza em Deus. E poderíamos dizer que vai além: Um amor que é Deus. Que cativa a todos os homens não por bens materiais, ou por posses e títulos, mas por Sua Palavra, por Seu Filho, que, morrendo na cruz, destruiu todo o pecado, e nos inseriu no seu mistério de salvação. É preciso, não obstante, que deixemo-nos cativar por Ele, e não buscar impô-Lo em nossas ideologias, ou adaptá-Lo aos nossos sentimentos.

No versículo 6, porém, Paulo fala algo que me chama particular atenção: “Vos tornastes imitadores nossos e do Senhor, acolhendo a Palavra em meio a muita tribulação e, no entanto, com a alegria que vem do Espírito Santo”.

Destas informações podemos fazer diversas analogias com nossos dias. Em primeiro lugar, o termo “imitadores nossos e do Senhor”. Devemos então centrar-nos um pouco aqui. Imitar! Como esta palavra é tão mais realista em nossos dias, e para nós cristãos. É preciso que nos tornemos imitadores. Imitadores na radicalidade, capazes de renunciarmos tudo para abraçar o ideal de Jesus Cristo, o qual Paulo abraçou e jamais se desapegou deste.

Porém, por vezes, parece que este imitar sente-se abalado mediante as divergências e oportunismos que figuram-se no mundo. Somos chamados a acolher a Palavra, e acolhendo-a então, poderíamos sentir-nos firmes, permeados da fortaleza que Deus nos concede dia a dia, ainda que mediante as dificuldades, possamos nos fixar unicamente no Evangelho. Um Evangelho que não é um conjunto de ideologias, mas é muito mais que isso: é o próprio Jesus Encarnado que faz-se Palavra de vida eterna. Só estando com Cristo poderemos ter plena força, e só então os homens poderão transcender. E esta transcendência não será apenas aparente, mas dar-se-á no interior, quando os homens não irão buscar mais o ter, e sim o ser.

Também nos é possível fazer uma associação com as palavras do Senhor, que nunca cessam de ressoar: “Se alguém quer vir após mim, renegue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me” (Lc 9, 23).

Precisamos ter em mente, primeiramente, que estas palavras salvíficas, de certa forma, exprimem um intrínseco imitar. Aquele que imita a Cristo, aquele que deseja fazer de sua vida um modelo de santidade, deve também carregar sua cruz. Não se pode esperar que nosso seguimento e doação total a Ele não tenha reação por parte de uma sociedade subjetivista.

Em segundo lugar, centremo-nos nas palavras “acolhendo a Palavra em meio a muita tribulação e, no entanto, com a alegria que vem do Espírito Santo”. Tribulações! E quantas vezes elas se põem no caminho do cristão! Quanto mais nos dedicamos ao anúncio do Evangelho, mais somos tentados a estarmos contra ele, a fazermos o que não nos é permitido. Parece-nos também paradoxal esta afirmação de São Paulo. Como pode alguém na tribulação, possuir a alegria?

A resposta para tal pergunta poderemos encontrar ao longo de toda a Sagrada Escritura. Precisamente no sofrimento, na tribulação, quando já não sentimos que Deus está conosco, aí então Ele se manifesta de uma forma forte, capaz de mover-nos, mesmo em nossos sentimentos mais profundos, seja de ódio ou de angústia; e no lugar dá-nos a alegria, vinda do Espírito, que atinge a cada um de forma diferente, mas com a mesma finalidade: tornar-nos cidadãos do céu. Alegria esta que nos impulsiona a sermos autênticas testemunhas do Evangelho. Testemunhando-o, antes de tudo, com nossa vida.

No capítulo 10, Paulo refere-se, pela primeira vez, à Parusia de Jesus Cristo. Escreve ele: “Pois todos contam como fomos recebidos por vós e como, virando as costas aos ídolos, vos voltastes para o Deus vivo e verdadeiro e vos pusestes ao seu serviço, na espera do seu Filho, Jesus, que ele ressuscitou dentre os mortos e que virá dos céus para nos arrancar da ira que vem vindo”.

Os tessalonicenses viraram as costas para os ídolos. Viremos também nós as costas para os ídolos que impregnam de forma maléfica a nossa sociedade. Voltemo-nos contra a ganância e o poder do consumismo; voltemo-nos contra as drogas e o uso desregrado do dinheiro; voltemo-nos contra os vícios e prazeres carnais, fora dos ensinamentos evangélicos.

Sigamos unicamente o Deus vivo e verdadeiro, que é capaz de confortar-nos e de nos abrir as portas para as eternas alegrias. Um Deus que nos ama sinceramente pelo que somos, e não pelo que possuímos. Deus que envia Seu Filho único para a Redenção do mundo, e para nos livrar dos abismos que nossos pecados causaram. Que o mundo se abra a Jesus Cristo e experimente o seu incomensurável amor por cada um de nós. Que o mundo se abra à verdadeira libertação, que não redime o homem por meio de seus bens, mas o liberta unicamente por Cristo Senhor.

O Ressuscitado, conforme diz São Paulo, vai nos “arrancar da ira que vem vindo”. Mas que ira seria esta?  Poderíamos associá-la ao Juízo Final, último acontecimento da obra Salvadora de Jesus Cristo. Não se expressaria exatamente pelo termo ira, seria demasiado pesado para nós; porém, para a comunidade da época, assim São Paulo no-la associou, visto que os pecados excediam, não a misericórdia de Deus, pois ela é verdadeiramente incomensurável, e o próprio Jesus atesta a Santa Faustina: “A falta de confiança das almas dilacera-Me as entranhas. Dói-me ainda mais a desconfiança da alma escolhida. Apesar do Meu amor inesgotável, não acreditam em Mim, mesmo a Minha morte não lhes é suficiente. Ai da alma que deles abusar!” (Diário de Santa Faustina, 50).

Portanto, também vemos uma perspectiva escatológica nestes textos. Que a nossa preparação para o advento definitivo do Senhor não seja apenas por temor do inferno ( = morte eterna), mas, sobretudo, por reconhecimento ao Amor de Jesus, que não faz distinções, e deveras olha a todos igualmente.

Peçamos neste dia a intercessão de Santa Isabel da Hungria, Padroeira da Ordem Franciscana Secular. Dela nos diz o Santo Padre Bento XVI, quando ainda era o Cardeal Ratzinger:

“O que fez foi realmente viver com os pobres. Desempenhava pessoalmente os serviços mais elementares do cuidado com os doentes: lavava-os, ajudava-os precisamente nas suas necessidades mais básicas, vestia-os, tecia-lhes roupas, compartilhava a sua vida e o seu destino e, nos últimos anos, teve de sustentar-se apenas com o trabalho das suas próprias mãos.(…)

Deus era real para ela. Aceitou-o como realidade e por isso lhe dedicava uma parte do seu tempo, permitia que Ele e sua presença lhe custassem alguma coisa. E como tinha descoberto realmente a Deus, e Cristo não era para ela uma figura distante, mas o Senhor e o Irmão da sua vida, encontrou a partir de Deus o ser humano, imagem de Deus. Essa é também a razão por que quis e pôde levar aos homens a justiça e o amor divinos. Só quem encontra a Deus pode também ser autenticamente humano”. (Da homilia na igreja de Santa Isabel da Hungria de Munique, em 2 de dezembro de 1981).

Perseguida para triunfar

“Conta-se que São Pio X, durante audiência aos membros de um dos colégios eclesiásticos romanos, perguntou aos jovens estudantes:

– Quais são as notas distintivas da verdadeira Igreja de Cristo?

– São quatro, Santo Padre: Una, Santa, Católica e Apostólica – respondeu um deles.

– Não há mais de quatro? – indagou o Papa.

– Ela é também Romana: Una, Santa, Católica, Apostólica e Romana.

– Exatamente, mas não falta mencionar ainda uma característica das mais evidentes? – insistiu o Pontífice.

Após um instante de silêncio, ele próprio respondeu:

– Ela é também perseguida! Esse é o sinal de sermos verdadeiros discípulos de Jesus Cristo”.

(Revista Arautos do Evangelho, nº 107, pag. 9)

Assim, pois, com esta imagem da Igreja perseguida, desejo iniciar a meditação de hoje.

Em mais um ano litúrgico que aproxima-se de seu término, as leituras nos convidam a preparar-nos para a vinda iminente do Senhor (Natal), como também direciona nossos olhares para o Advento definitivo e para a sua Parusia.

A primeira e a segunda leitura de hoje, são, de fato, um convite a uma mudança de vida imediata, uma autêntica conversão que nos ponha em Cristo, em seu coração, e nos faça partícipes do seu Reino no banquete ao qual somos convidados.

Na primeira leitura, o alerta do profeta faz com que também nos sintamos responsáveis pelos nossos atos já agora, enunciado ao mesmo tempo que nós somos responsáveis a nos condenar ou a nos salvar. Não podemos culpar a Deus por nosso fim último, pois somente a nós cabe defini-lo. E por que falo assim? Porque assim nos mostra Malaquias ao falar do vindouro dia, o dia que todos esperam; tanto aqueles que estão cravados nas rochas sepulcrais, como aqueles que neste mundo se dedicam ao Evangelho, ou, pelo contrário, dedicam-se somente a fazerem festas, a comer e a beber, sem, no entanto, fixarem os olhos no julgamento: “Eis que virá o dia, abrasador como fornalha, em que todos os soberbos e ímpios serão como palha; e esse dia vindouro haverá de queimá-los, diz o Senhor dos exércitos, tal que não lhes deixará raiz nem ramo. Para vós, que temeis o meu nome, nascerá o sol da justiça, trazendo salvação em suas asas” (3, 19-20a).

Temamos ao Senhor, portanto! Não um temor que nos faça olhá-Lo como um Deus prepotente, que se afasta de nós, que se fecha nos mais insondáveis Céus. Mas, não obstante a distância que agora nos separa de Deus, nos conforta saber que o temos do nosso lado; e que o temor que devemos ter é salutar e deve nos conduzir à verdadeira salvação que é Ele próprio.

Na segunda leitura São Paulo nos chama a abandonar a ociosidade e toda a preguiça malígna, que nos afasta de Deus e dos diversos meios de missão que a nós são confiados. “Quem não quer trabalhar também não deve comer” (2Ts 3, 7 – 12). O que vem a ser esta máxima de São Paulo? Por que assim dirige-se a comunidade de Colossos? Já pude aludir neste site que o Reino de Deus é constituído também de renúncias, e renúncias às vezes muitos difíceis.

Ora, a carta de São Paulo a Colossos é também uma carta destinada a falar veementemente da Parusia. Trata-se, portanto, de uma organização da Igreja voltada para a escatológia. A Igreja é chamada a ser prefiguradora do Reino do Senhor. Tais palavras do apóstolo são um incentivo à missão, postas, obviamente, em uma figura escatológica. Como podem querer desfrutar do Reino vindouro aqueles que não trabalham, mas sustentam-se, como costumamos dizer, às “custas” dos outros? Por isso é como se fizéssemos uma analogia às palavras de São Paulo: Quem não quer assumir sua idêntidade cristã; quem não quer ser missionário, então que também não seja partícipe do Reino de Deus. Ora, alguns podem perguntar: onde está a misericórdia de Deus? Será que Sua misericórdia só atende aos cristãos? Digo: se Ele não manifestasse sua justiça, não menor que sua misericórdia, então não seria Deus. “Tem Ele, por assim dizer, duas mãos: a da misericórdia e a da justiça. Com a primeira, perdoa e protege; com a segunda, cobra e castiga; De uma dessas mão ninguém escapa” (Mons. João Scognamiglio Clá Dias, Revista Arautos do Evangelho, pag.11-12, Edic.107).

Santo Afonso Maria de Ligório afirma:

“Não merece a misericórdia de Deus quem se serve dela para ofendê-Lo. A misericórdia é para quem teme a Deus, e não para o que dela se serve com o propósito de não temê-Lo. Aquele que ofende a justiça pode recorrer à misericórdia; mas a quem pode recorrer o que ofende a própria misericórdia.”

(Preparação para a morte. Cons. XVII, ponto I)

E eis que chegamos ao Evangelho (Lc 21, 2-19), ao qual gostaria de centrar-me pela sua riqueza.

Ora, Jesus fala aqui do final dos tempos, mas também da perseguição, que a Igreja por muito tempo sofreu e ainda sofre. Por isso iniciei este post com aquela pequena história. Porque, não obstante estes dois mil anos, não cessam as perseguições inutilmente lançadas por Satanás para tentar, de alguma forma, derrubar a Igreja. Pois digo e ainda garanto: Se se levantasse todo o inferno e seus soldados, liderados pelo Príncipe das trevas, para tentar derrubar a Igreja, ainda assim, nunca conseguirão. Pois a nossa Igreja não é fundamentada em ideologias mitológicas e vazias, mas fundamenta-se unicamente em Jesus Cristo, Deus verdadeiro feito homem.

“Algumas pessoas comentavam a respeito do Templo que era enfeitado com belas pedras e com ofertas votivas. Jesus disse: ‘Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído’” (vv. 5-6).

O Templo era lugar sagrado para os judeus, e para o próprio Jesus. No entatanto, por que o Senhor dirige palavras tão ásperas àquelas pessoas? Ora, não obstante o templo ser lugar de oração, mas não contemplava-se além de uma mera visão naturalista. Estavam, por conseguinte, cegos para Deus, pois detinham-se na criatura e não no Criador; compreendiam o símbolo, mas não o Simbolizado. Por isso, contundentemente exorta Nosso Senhor.

E esta profecia não tardaria mais de quarenta anos para acontecer. Como escreveu São Beda: “Permitiu a Divina Providência a destruição de toda a cidade e do Templo para que nenhum daqueles que ainda estavam débeis na fé fossem seduzido por suas diversas cerimônias”.

Ainda assim os apóstolos achavam que essa destruição se daria na consumação dos séculos. Mas Jesus faz questão de manifestar-se sobre os dois momentos, para mostrar que não iria tardar acontecer aquilo que, de certa forma, seria jubilar. Destruído o Templo, a Lei deveria então ceder lugar à Graça, manifestada plenamente em Jesus.

Antes, porém, que estas coisas aconteçam, sereis presos e perseguidos; sereis entregues às sinagogas e postos na prisão; sereis levados diante de reis e governadores por causa do meu nome. Esta será a ocasião em que testemunhareis a vossa fé. Fazei o firme propósito de não planejar com antecedência a própria defesa; porque eu vos darei palavras tão acertadas, que nenhum dos inimigos vos poderá resistir ou rebater” (vv. 12-15).

Anunciando aos Apóstolos o que lhes haveria de acontecer, Jesus prenuncia a imagem da Igreja perseguida. Errôneo seria se a Igreja, mediante essa perseguição, se ocultasse de sua missão e se fechasse em si mesma, não completando sua missão de anunciar o Evangelho a todos os povos. Mas é verdade que, sobretudo na perseguição, Nosso Senhor põe-se ao lado dela, para que não pereça nunca, mas, como Ele próprio prometeu, seja invencível (cf. Mt 16, 18) e enfrente as tribulações que se fazem presente neste mundo. E não apenas isto: que ela seja triunfante. Esta é a figura da Igreja escatológica. Aquela que, como retrata o Apocalípse, desceu do céu gloriosa (cf. 21, 9-11a).

De fato, conta-nos a história que Napoleão, após ser excomungado pelo Papa Pio VII, perguntou, petulantemente, ao legado papal, se por causa disso as armas das mãos dos seus soldados iriam cair. Ora, o Conde de Ségur, testemunha ocular, narra: “As armas dos soldados pareciam ser de um peso insuportável para seus braços intumecidos; em suas frequentes quedas, escapavam-lhes das mãos, quebravam-se ou perdiam-se na neve” (Conde de Ségur apud Barón Henrion Historia general de la Iglesia 2ª ed. VIII, pag. 153).

Nas horas de tempestade a Providência Divina nunca faltou à Igreja. Suscitou homens e mulheres firmes e de vida paradigmática. E aí eles testemunharam sua fé, como também nós somos chamados a fazê-lo. Não sejamos ocultos ao mistério que nos foi revelado. Muito menos deixemos que a nossa vida seja afastada de Deus. Só Deus pode fortalecer a caminhada do homem. Só n’Ele os homens podem encontrar uma felicidade que não é interesseira, mas busca elevar a humanidade até Ele.

Com a afirmação em não nos planejar em preparar defesa com antecedência, Nosso Senhor não nos convida à negligência, mas não quer que nos aflinjamos, pois Ele estará conosco. Vale-nos aqui o que diz Santo Inácio: “Rezai como se tudo dependesse de Deus e trabalhai como se tudo dependesse de vós” (catecismo da Igreja Católica, 2834).  E São Gregório Magno escreve: “É como se o Senhor dissesse a seus discípulos: ‘Não vos atemorizemos. Vós ireis ao combate, mas Eu é que combaterei; vós pronunciareis palavras, mas quem falará sou Eu’” (São Gegório Magno apud Revista Arautos do Evangelho, pag. 13, Edic.107).

Que a Virgem Maria ajude a Igreja, e também a nós, a caminharmos ao encontro de Seu Filho. E que, mesmo diante dos conflitos, possamos sempre ter à nosso horizonte a gloriosa Igreja Católica Apostólica Romana de Nosso Senhor Jesus Cristo, que triunfará pelos séculos.

Meditações sobre as Cartas Paulinas

Carta de São Paulo aos Tessalonicenses – Introdução

Hoje damos início às meditações das Cartas Paulinas. A muito tempo vinha idealizando este projeto, que só agora foi posto em prática. Verdadeiramente precisamos ter uma maior compreensão dos textos sagrados, e mais que isso: precisamos vivenciá-lo na vida cotidiana, mesmo com as grandes pressões que o mundo hoje apresenta.

Seria um meio de ajudar nas reflexões – não obstante as que já são apresentadas domingo – e estudos sobre o que pensava São Paulo, e como poderíamos fazer uma analogia de seus pensamentos. Por isso meditaremos com a maior clareza possível, para que todos os leitores possam ter compreensão do texto.

Paulo constitui um verdadeiro modelo de missionário, que se doa sem reservas a Cristo e ao seu Evangelho. Este “totalmente” veremos presente se observarmos a sua vida que é doada por Cristo; o seu sangue derramado nos diz que jamais devemos calar. Ainda que fortes sejam as adversidades, mais fortes serão as graças e a força daquele que se une a Cristo Jesus.

É importante dizer que é inútil buscarmos um aprofundamento teológico nesta carta, pois ela é efetivamente de caráter pastoral. Aqui Paulo dirige-se ao coração, falando de amor, alegria, reconhecimento, e a enunciação da vinda do Senhor, preparando a todos quais ele se dirige.

Mas então podeis perguntar-me por que inicio com a meditação da carta à comunidade de Tessalônica e não de Romanos, como está organizado na Sagrada Escritura? Bem, esta foi a primeira carta de Paulo à comunidade recentemente fundada; e por isso acho que para compreendermos melhor devemos estar de acordo a escrita das cartas. Então, antes de começar os estudos, que serão divididos por capítulos, aprofundar-nos-emos nas características de cada comunidade, começando pela já citada; e, assim, ao decorrer de cada carta farei uma breve leitura social e religiosa que caracterizavam a sociedade da época de Paulo.

Como já foi afirmado, a Tessalônica, Paulo dirige sua primeira carta. Lá Paulo fez uma evangelização durante o ciclo das suas segundas viagens, por volta do inverno dos anos 49-50.

Era, pois, uma cidade de grande porte e populosa – como também hoje temos, claro que em números maiores – com 300.000 habitantes, sendo a segunda cidade grega mais importante depois de Atenas. Sendo uma cidade portuária, possuía um dos portos mais seguro dos portos comerciais do mar Egeu.

“O período de evangelização foi curto, mas suficiente – aproximadamente de três ou quatro meses pelo menos – para deixar uma comunidade cristã elementarmente organizada, que supõe manter-se fiel ao ensinamento recebido (1Ts 1, 2-10), defendendo-se eficazmente tanto do ambiente pagão, sempre sedutor e ameaçante (1Ts 4, 1-12), como das contínuas pressões e ciladas provenientes da comunidade judaica mais ativa e beligerante na cidade de Tessalônica (1Ts 2, 13-16). Era lógico, no entanto, que não faltassem dificuldades. Prevendo-as, Paulo envia-lhes Timóteo, que regressa alguns meses mais tarde portador de boas notícias no conjunto, mas também de alguns problemas” (Comentários ao Novo Testamento III, Edit. Ave Maria, pag. 559, 2ª Edição).

Tais problemas encontrá-los-emos mais à frente nas meditações no decorrer da carta.

Mas, de imediato, dois temas figuram logo nos primeiros capítulos, e indubitavelmente notá-lo-emos durante toda a carta: a Parusia de Nosso Senhor, o seu advento definitivo – e precisamente a este tema Paulo dedica boa parte da carta, sobretudo ao preocupar-se com o destino último da comunidade – e uma descrição da Igreja. Poderemos avaliá-los, e aprofundarmo-nos, na devida ocasião que nos for permitido pela carta.

Por acréscimo tenho a dizer que nossos estudos serão publicados às quartas-feiras. Espero que aproveitem! No próximo estudo já começaremos as meditações.

Permaneçam na Paz de Jesus e no Amor de Maria!

Chamados à santidade

A Solenidade de Todos os Santos – que ocorre a primeiro de novembro, mas a Igreja no Brasil convida-nos a celebrar no domingo mais próximo – não se-nos apresenta como uma realidade impossível, e mesmo inacessível aos olhos humanos, mas tende, pelo contrário, a aproximar-nos de Deus, fazendo com que tornemo-nos partícipes do seu banquete escatológico e da vida eterna. Não obstante as constantes distrações e facilidades que o mundo apresenta, devemos fixar-nos em Cristo, voltarmo-nos a Ele, e, abertos à Sua mensagem, instaurar um Reino de Paz e amor, de justiça e fraternidade. Não um Reino utópico, mas um reino verdadeiro, ao qual devemos viver e esperar segundo as expectativas evangélicas.

Mas aqui gostaria de formular uma pergunta que – à medida que buscarmos uma vivência segundo os mandamentos – tornar-se-á mais veemente e ajudar-nos-á a colocarmo-nos em uma vivência íntima com o Senhor: Como ser santo hoje, em uma sociedade capitalista, que deseja denegrir a imagem de Deus, confiando em suas próprias expectativas e esquecendo que realizar-se-á somente aquilo que Deus destinou-nos? E mais ainda: Quem é Jesus para nós?

Essa dúplice pergunta remete-nos de imediato às leituras do dia. Por isso analisá-las-emos, fazendo uma analogia com os dias hodiernos e com o convite a santidade, dirigido também a nós.

No livro do Apocalipse (cf. 7, 2-4. 9-14), que tomamos hoje na liturgia, há uma riqueza de simbolismos, e narra de forma clara quem são os santos e como nós também somos chamados. Fala-se que os marcados com o selo do Cordeiro eram 144 mil. Isto significa que só serão salvos tal quantidade? Não! Essa simbologia numérica sempre ocorre na Sagrada Escritura. Tal quantidade seria a multiplicação das doze tribos de Israel por doze, e em seguida por mil, que é a cifra da história da salvação.

Em seguida narra-nos o apóstolo: “Vi uma multidão imensa, que ninguém podia contar, gente de todas as nações, tribos, povos e línguas. Estavam em pé diante do trono e do Cordeiro, vestiam túnicas brancas e tinham palmas nas mãos” (v. 9). Vemos aqui a figura dos santos, que põe-se em adoração diante do Senhor e nos mostram que, assim como eles chegaram, não nos-é também impossível lá chegar. Estavam de pé. Ora, no citado livro estar de pé significa já ser participante da vitória. Uma vitória que não é por mérito nosso, mas de Cristo. Esta foi-nos concedida por Cristo ao pender no lenho sagrado da Cruz, e de lá, com seu sangue, lavar nossos pecados e ensinar-nos a sermos pessoas melhores. Estavam com túnicas brancas, sinal da pureza, e assim vestiam-se com a glória de Cristo.

É manifesta também aqui a unicidade e unidade da Igreja. Uma Igreja que, mesmo sendo constituída de diversas culturas, uni-se em um só canto, rendendo graças a Deus por intercessão dos Santos. Negros, brancos, amarelos, índios, homens, mulheres, Papas, Bispos, Sacerdotes, Diáconos, coroinhas, reis e rainhas, religiosos e religiosas, gordos e magros… Na Igreja não há distinção. Todos são um perante Deus, e todos formam um só coro de agradecimento e louvores incessantes ao Altíssimo.

E aqui respondemos a primeira pergunta sobre como ser santo hoje. É necessário que morramos para este mundo, e assim poderemos viver para Deus. “Sem um ‘morrer, sem a destruição do que há de mais individual, não há comunhão com Deus nem redenção” (Papa Bento XVI, Jesus de Nazaré, pag. 74).

É, portanto, necessário que o santo esteja a disposição do próximo; que ele saiba servir; que esteja fora do seu “mundinho” e de seu individualismo; que não busque colocar as suas expectativas eternas nas limitações deste mundo. Santos que verdadeiramente amem o Senhor, vencendo a mesquinhez e doando-se sem reservas ao projeto salvífico que produzirá abundantes frutos.

Na segunda leitura São João nos mostra a graça de sermos chamados “filhos de Deus”, e se somos filhos é graça a Jesus Cristo e a nossa comunhão com Ele (cf. ibid., pag 131). “Se o mundo não nos conhece, é porque não conheceu o Pai” (1 Jo 3,2). Nosso Senhor precisa ser apresentado a todos, ainda que sua mensagem não agrade a muitos.

A mensagem de Cristo não garante uma vida de comodidade a nenhum de seus seguidores. A renúncia e o sacrifício constituem uma das vias para vermos resplandecer a glória de Cristo. Aqui chegamos a segunda pergunta: Quem é Jesus para nós? Um profeta que anunciou uma mensagem de amor? O Filho de Deus? Um mito? Essa resposta deve ser pessoal, pois dirige-se a cada um em particular.

Quem busca uma glória sem passar pela cruz terá uma vã glória. Será uma glória meramente passageira, e não nos colocará em estrita união com nosso Salvador. Somos frágeis, e esse é o primeiro passo que devemos dar para buscarmos a santidade: reconhecimento de nossa fraqueza. Ora, como então, pecadores, poderemos ser comparados aos Santos? Eis que nos diz o apóstolo Paulo: “Onde abunda o pecado, superabundou a graça” (Rm 5, 20). Os santos também foram pecadores, mas diferente de nossas muitas atitudes, eles souberam escutar a Deus; souberam que sua vontade não poderia prevalecer diante da vontade de Deus.

Eis, então, que se deveras amamos a Deus, deixemos que Ele possa agir e nos transformar. Assim, Jesus já não será mas um mito, ou um profeta, mas será aquele que nos motiva a uma mudança de vida.

Por fim chegamos ao Evangelho, ao qual poderia discorrer muito sobre tal, mas abreviar-me-ei para que o texto não seja demasiado cansativo.

Jesus sobe ao monte para ensinar e senta-se. Estar sentado significa estar em atitude de ensinar, por isso, ao proclamar um Dogma ou ao falar Ex Cathedra, os Papas devem estar sentados na Cátedra, de onde presidem a Igreja. Para os que desejam aprofundar-se no Sermão da Montanha recomendo a leitura do livro Jesus de Nazaré, do Santo padre Bento XVI. Gostaria apenas de destacar alguns pontos fundamentais.

Em primeiro lugar somos chamados a sermos discípulos de Cristo, e o Sermão da Montanha é um forte convite a esse discipulado, que, por sua vez, dirigir-nos-á à santidade.”O Sermão da Montanha dirige-se a toda a vastidão do mundo, presente e futuro, mas ele exige discipulado e só pode ser verdadeiramente entendido e vivido seguindo-se Jesus, caminhando-se com Ele” (Papa Bento XVI, Jesus de Nazaré, pag. 75).

Podemos associar as bem-aventuranças com a imagem da Igreja, perseguida, humilhada, mas que sempre consola-se de suas tribulações, pois sabe que Cristo está aos seu lado. E precisamente quando sofre, a Igreja sabe que está na direção correta. Podemos também associá-las com a realidade humana voltada à condição espiritual.

Peçamos que, pela intercessão de todos os Santos e de Maria Santíssima, também nós trilhemos nosso caminho de santidade, mesmo com nossa fraqueza humana.

Salus et Pax in corde Iesus et Maria.